quarta-feira, 20 de maio de 2020

SKA, Rocksteady e Early Reggae: A Década de Ouro da Jamaica



         Não há dúvidas que a década de 60 foi um divisor de águas para a história da Jamaica. Nestes anos se deram os períodos com acontecimentos que estão marcados politica e economicamente, mas sobretudo cultural, o que é determinante para a concretização das características jamaicanas, colaborando com o nascimento de alguns ritmos musicais.  Fatos como a independência da ilha e a visita da majestade imperial Haile Selassie I na mesma década fizeram com que estúdios e gravadoras decolassem musicalmente, gerando assim diversos ritmos em um período curto de tempo e que hoje são fundamentais para a gente entender toda a trajetória da música jamaicana.


    Em 1494, Cristóvão Colombo chegou à ilha e a fez colônia espanhola por quase 200 anos. O território contava com a ajuda britânica para impedir a invasão de piratas que  roubavam as riquezas locais. Em 1655, a área foi batizada como Jamaica e se tornou colônia britânica, num processo que durou cerca de 15 anos com a assinatura do Tratado de Madrid, em 1670. A Espanha reconheceria a soberania da Inglaterra sobre a Jamaica, tornando a ilha a colônia mais importante para a Inglaterra na plantação e exportação de cana de açúcar e cacau por pelo menos 300 anos, conquistando sua independência em 1962.


    O processo de independência jamaicano perpassa pela conjuntura da Guerra Fria. (1947-1991) O conflito entre os Estados Unidos e a União Soviética na qual ambos se dedicavam em buscar influenciar ideologicamente aliados políticos de outros países caso uma guerra militar ocorresse. Com o enfraquecimento econômico das grandes potências devido os prejuízos causados nas grandes guerras mundiais, houve um descontrole em algumas colônias como na própria Jamaica que em 6 de agosto de 1962 se tornou independente graças ao partido trabalhista jamaicano (JLP) e o seu representante na presidência Alexander Bustamante que exigiu o fim da federação e a autonomia da ilha como nação.

   Quatro anos após a sua independência, o país recebe a visita da majestade Haile Selassie I que deixa o palácio imperial etíope em meio a conflitos e cruza o atlântico para conhecer a recém independente Jamaica. Selassie já era tido como o maior ícone do patriotismo negro na Jamaica, muito por conta das ações pan-africanas de Marcus Garvey, contando com uma recepção calorosa de pelo menos 100 mil pessoas que rugiam para o Leão de Judá e festejavam sua presença. Sua visita é comemorada todo ano no feriado de Grounation no dia 21 de abril realizando cerimônias Nayahbinghi e celebrando a visita do imperador a ilha.



O Imperador Haile Selassie I sendo recebido pelo povo Jamaicano com muita festa e oração em 1966. 


    A década de 60 foi tão importante para a política e cultura da Jamaica quanto para a música. Com os estúdios e gravadoras em ascensão devido ao movimento da cena Sound System, os talentos locais se multiplicavam nos bairros buscando seu espaço. Neste período se criou diversos estilos musicais que virariam sucesso na ilha e influenciariam diretamente a criação do Reggae: o SKA, o Rocksteady e o Early Reggae. Esses três ritmos são a coluna vertebral do Reggae, e todos os subgêneros conhecidos são variáveis de um desses três ritmos primordiais. Meses antes da independência, surge não por acaso, em 1961, o SKA, tendo os metais herdados do Jazz como elementos principais e influenciado por ritmos como Rumba, Mento, Son e Calypso. O mesmo ganha esse nome devido a uma variação de ritmo produzido pela guitarra “ska, ska, ska”. O ritmo precursor do Rocksteady buscava a diversão em harmonia para a classe operária da Jamaica. Alguns anos depois, a segunda geração desse ritmo chegou na Inglaterra no final da década, sendo apreciado por jovens de classe operária inglesa; os Skinheads.

      Com músicos eufóricos e sedentos por música, não demorou muito para se criar uma variação do SKA, e quatro anos após seu nascimento e ascensão surge o Rocksteady, nome esse, batizado por conta da canção de Aston Ellis, intitulado com a mesmo termo (Rock Steady). Com a visita do Imperador, o estilo Rastafari se infiltrou no inconsciente da população, na qual o agitado SKA não conseguiu achar mais o seu lugar. O Rocksteady surge nesse encontro de músicos Rastas com os músicos que produziam SKA. A necessidade de uma disposição diferente do bumbo e da caixa no tempo da música, a redução dos metais e a implantação de letras que carregam muito valor, dão as características próprias do ritmo que é nomeado Rocksteady.


        Há quem diga que a onda do Rocksteady na Jamaica durou apenas 18 meses dando então lugar ao Early Reggae, que no período foi batizado de Regay e rapidamente trocado por Reggae. Com a criação do subgênero Roots o termo Early Reggae foi criado posteriormente para diferenciar um subgênero do outro. O Early reggae é marcado como o período de maior migração de músicos jamaicanos pra Inglaterra levando este ritmo pra toda Europa e encontrando um público estrangeiro que consome esse som. Como na Jamaica as coisas acontecem muito rápido musicalmente falando, no mesmo período o Early Reggae já fica pra trás com a criação de um novo subgênero: O Roots. Por conta da explosão da música jamaicana na Inglaterra e em toda Europa, o musico jamaicano viu pela primeira o potencial para espalhar sua música por todo mundo. O Early Reggae considerado o 3º ritmo musical jamaicano, possui uma bateria bem mais trabalhada, riffs de guitarra únicos e a presença do órgão Hammond. Mensagens de oposição, espiritualidade e resistência são características capitais do ritmo.


A banda jamaicana The Skatalities

    Depois de uma década bem movimentada na música, política e economia, a Jamaica estende o tapete vermelho para a explosão do Reggae que viria em 1970, a música Reggae já era familiar para europeus e norte-americanos, todos se agradavam com esse novo subgênero que era o topo do iceberg da música jamaicana e se sentiam prontos pra acolher nomes como; The Wailers, Black Uhuru, Burning Spears, e Lee Perry que chegaram ao topo na década de 70, dando as novas e principais características ao ritmo.

       O Álbum de Derrick Morgan " Seven Letters’’ gravado no último ano da década de 60, transita entre os três ritmos mais influentes da década: SKA, Rocksteady e Early Reggae, e conta com uma sincronicidade refinada entre os ritmos mostrando toda sua influência. Morgan tocou com músicos influentes como Jimmy Cliff e Bob Marley, e ao contrario deles, Derrick se dedicou ao SKA e ao Rocksteady mesmo após 1970. Para aqueles que tem curiosidade de conhecer um pouco sobre a importância deste período atráves dos ouvidos, fica a recomendação desse álbum tão importante para a histórica jamaicana. 



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